Menu

Blog

 25jan 

Três anos de impunidade

 

Texto: Ana Ribas Diefenthaeler

Fonte: A Notícia

Já falei sobre isso, de como não consigo esquecer aquele domingo. Por ironia do destino, acordara às cinco da manhã para fazer café para meu irmão, que estava voltando para Santa Maria após uns dias de férias por aqui. Depois das costumeiras e chorosas despedidas, decidi dormir um pouco mais. E me deitei ao lado de um alemão que parecia nem respirar, tão profundo era seu sono.

Mal tento fechar os olhos e, no criado-mudo, percebo que meu celular vibra loucamente, avisando de repetidos posts nas redes sociais. Um professor de jornalismo da Universidade Federal de Santa Maria, que me deu aulas de redação e de jornalismo literário, era um dos mais insistentes: morava próximo à Boate Kiss e, àquela hora, já contava os caminhões que transportavam os corpos que estavam sendo retirados do incêndio.

Demorei alguns segundos para entender o que estava acontecendo e, então, fui tentar ver os noticiários da TV. Nada, ainda – as equipes das emissoras nacionais acabariam chegando à tarde e à noite à minha tão machucada Santa Maria. Pouco a pouco, fui anotando os nomes dos jovens de minha nada pequena família e tentando contato para saber se estavam todos bem. Uma angústia sem fim.

Naquela manhã de domingo, 27 de janeiro de 2013, a cidade toda madrugou. Arrancadas da cama por sirenes e desespero, as pessoas tinham apenas uma coisa em mente: saber se seus amados jovens estavam na boate. Entre mil e 1,5 mil deles estavam lá, compartilhando um espaço adequado para 600 e pouco. Quando o fogo começou, muita gente correu para o lugar errado – pensando que havia uma saída nos fundos, aquela gurizada linda, a maioria universitários, correu para a morte, embretados no pequeno corredor que dava acesso aos banheiros.

Mas às cinco e pouco da manhã, eu não sabia, ainda, de nada disso. Queria apenas ter certeza de que meus sobrinhos estavam bem. Não imaginava a extensão daquela tragédia que nos roubou, impunemente, 242 jovens e feriu quase 700. Foi a maior, em número de mortos, nos últimos 50 anos no Brasil, a terceira maior do mundo, em se tratando de casas noturnas.

Nesta quarta-feira, dia 27, a Associação dos Familiares das Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria denuncia o caso ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Até agora, apenas quatro pessoas (dois sócios da boate e dois músicos) aguardando julgamento pelos fatos. Quatro bombeiros foram julgados e condenados. Nenhum outro agente público foi julgado. Não, não dá para esquecer!

Comentários (0)

Os comentários estão fechados.