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 21mar 

A alma é o sal da vida

 

Texto: Ana Ribas Diefenthaeler

Fonte: A Notícia

Trabalhamos quase que exclusivamente com valores exatos, matemáticos, cartesianos, concebidos pelo cérebro – ainda que relativizados pela antropologia. Sal da vida, a alma vai além desse valor – transcende. Posso usá-lo na medida e na dose que eu quiser, e isso quem define é minha própria essência. É esse o sal que acolhe a beleza, que se emociona com uma criança, que atropela a rotina para abrir espaço para a música, que comemora a estética. Mas é também o que amarga a dor de uma tragédia, que se veste de luto, que se retorce de indignação diante de males externos e injustiças. É ali que repousam, inabaláveis, o conjunto de valores éticos e as marcas da caminhada vida afora. Ali, ficam registradas as destemperanças e desesperanças não resolvidas. Ali, permanecem os carimbos da existência. Tenha o nome que tiver, na cultura onde estiver inserido, o sal da vida reina absoluto sobre o racionalismo exacerbado. É o contraponto da desumanidade. É o que nos faz gente. Mais que isso: que nos faz entender melhor toda a outra gente que gravita em torno de nós. É o ponto de partida e de convergência da solidariedade.

Mas, acima de tudo, o sal da vida é o melhor tempero para todos os nossos tempos – o tempo de sorrir, o de chorar, o tempo de refletir, o de seguir e o de recuar. O tempo de criticar e o tempo de ouvir. Todos os tempos de apenas um tempo de nós são equilibrados pela dose exata deste mágico sal.

Embora eu esteja aqui fazendo ilações sobre este conceito, devo esclarecer que a ideia não é minha – mas de um grande amigo, que gosta de filosofar um pouquinho, sempre que encontramos dez minutos de sossego entre sua agenda superlotada e seu espírito mais do que generoso.

Há muito não conversávamos – e isso me faz falta, porque sempre aprendo muito com ele. E quando me assaltam, novamente, esses conceitos existenciais, no meio de um burburinho político sem fim, impossível não lembrar do lindo conceito de alma. Mas também de outro sal, o da Terra, magistralmente talhado por Beto Guedes. “Terra, és o mais bonito dos planetas e estão te maltratando por dinheiro”, canta Beto, em um verso que se encerra no conceito de que o planeta é a nossa nave-irmã.

E este mesmo sal que nos impõe vísceras e acolhimento, dores, suores e sangue, que nos deixa mais colorida a verve e cristalina a visão do outro, é que nos inspira a ouvir o que nos pede a alma, apreensiva, neste tempo de destemperos: “Deixa nascer o amor, deixa fluir o amor, deixa crescer o amor, deixa viver o amor – que é este, sim, o sal da Terra”.

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